Caos
Era
feita de caos, daquele caos sagrado que funde tudo que é visceral e
mundano, que perpassa toda a existência a procura de uma ordem que
seja a da imperfeição organizada, a da sujeira límpida por ser
honesta em sua podridão. E assim tudo era sagrado, do esgoto à
hóstia. Dessa forma, ela também seria sagrada. O estampido que
das batidas do seu coração saia de forma fragorosa retumbava a sua
sacralidade de não saber se encontrar, de estar perdida dentro de si
mesma, de não saber em qual recôndito, qual compartimento dentro de
si se perdeu.
Estava
esgotada, incerta de si mesma, perdida em um palavrório inesgotável
que usava para traduzir sua indefinição em palavras. Absorta numa
espécie de bruma, de delírio vertiginal que fazia que todo o
preenchimento fosse vago, vazio em significado, sem importância.
Era o
caos, e o caos era a regra, a ordem da incerteza rutilante que
crispava a cavidade do que ela chamava de existência. Ela amava o
caos. O caos a fazia ser, graças a ele ela era, se reconhecia como
presença que o habita e reconhece. E por amar o caos amava a vida,
tudo era sublimação, tudo era ardência pulsante que dizia do
eterno.,do estertor que brota daquilo que ferve por dentro e que quer
gritar de tão simples que é mas que se verte em algaravia quando
dele se tentam apreender algo como agora acontece. É um ninho de
palavras inertes, inócuas, rasas quando de trata de tocar o ardor do
caos que lateja por dentro.
Ela era
dessa espécie de gente, pedacinho de caos ambulante que vaga pela
vida a procura de um abrigo, um espaçozinho pra se acomodar e se
autoincomodar, de ser caos quietinha no seu canto, em paz. Ser caos e
paz atados por laços de veias que são canais da explosão que nunca
cessa em todos os corpos desde o início dos tempos mesmo depois de
inertes, posto que estes no final sempre se transmutam para atuarem
de maneiras diferentes das anteriores. Se sentia viva por ser caos,
mesmo que não a amassem se sentia amada, pois era o amor do caos.
O caos
é a ordem em si, sem ele não há troca não há gênese, fusão,
ignição, atrito, fluxo, impulso, força, potência. Não há grito,
não há voz, não há cópula, não há carne, nada nasce, nada
cresce, pois dele tudo sai, tudo segue, tudo é. E é sagrado porque
é. E Ela é.
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